ENTRE A FOME E O SILÊNCIO
Uma análise da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça atinente ao Direito Humano à Alimentação Adequada
Palavras-chave:
Alimentação, Direito, JurisprudênciaResumo
Em 1991, com a ratificação do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, o Brasil reconheceu a alimentação enquanto direito. Este reconhecimento foi corroborado pela edição da lei federal n. 11.346/2006 e pela promulgação da Emenda Constitucional n. 64/2010, que incluiu o Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) no rol de Direitos Sociais explícitos da Constituição Federal. Apesar da normatização do DHAA, na prática, em 2022, o Brasil contava com 125,2 milhões de pessoas em insegurança alimentar, incluídas neste grupo, as mais de 33 milhões de pessoas em situação de fome, a modalidade mais grave de insegurança alimentar. Com a envergadura normativa dos diplomas citados e a crise famélica observada no país, aventou-se a hipótese de que haveria uma grande quantidade de demandas envolvendo o DHAA no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ) – órgão jurisdicional responsável pela uniformização interpretativa da legislação federal. Aventou-se ainda que o enfoque interpretativo do DHAA na jurisprudência do STJ era primordialmente orientado para o enfrentamento da fome. Pautada em metodologia descritiva, a partir de dados coletados diretamente da jurisprudência do STJ, analisados qualiquantitativamente, a pesquisa objetivou compreender quantas e quais foram as demandas sobre DHAA que alcançaram aquela Corte e como esta se manifestou. Concluiu-se que apenas 04 (quatro) acórdãos tratando explicitamente sobre DHAA foram proferidos pelo STJ ao longo de toda sua existência, sendo que nenhum enfocou o enfrentamento da fome, limitando o DHAA à Adequação Sanitária, isto é, à busca por alimentos livres de substâncias nocivas à saúde.
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